Exceto Miranda que jura que elas acabam depois do dia de Reis. Aí vem a estiagem que só vai terminar em finados.
Na certa ela começa em outubro, se El Niño ou
Chove todos os dias. Às vezes dias seguidos, sem descanso.
A terra que é de barro vermelho, quase roxo, gruda nas solas dos sapatos. A uma camada se sobrepõe outra e o sapato ganha um solado grosso, que pesa mais a cada passo dado. Os pés parecem com os ferros de passar roupa antigos esquentados pelo carvão incendiados dentro deles e que por descuido ficavam com a face rubra do fogo.
Quando há algum sol é o tempo de olhar para o céu, dizer que bom: um pouco de azul! E só. Logo as nuvens amontoam e recomeça a chover. Nesta época só é possível saber da lua pela folhinha e jornais. Mas às vezes, depois de uma pancada de chuva, surge um céu totalmente estrelado. E pode ser reiniciado o reconhecimento das constelações. Rapidamente. Logo as nuvens se amontoam e recomeça a chover.
Os tropeiros evitavam passar pelo sul de Minas nesta época chuvosa. As opções, no entanto, eram poucas. Vindos de Campanha, a capital das Minas Gerais, uma vez capital do Brasil, para levar o quinto de ouro da coroa, com os burros e cavalos carregados, poucos caminhos haviam sido abertos que pudessem percorrer. Pelo sul do estado, eles chegavam à Juiz de Fora, desciam a serra de Petrópolis e logo estavam no porto de Estrela, no município de Magé, no Estado do Rio de Janeiro, onde aportavam navios de grande calado que navegavam pelo Rio Parayba do Su.Chegavam de Portugal trazendo móveis, tecidos, alimentos e mais pessoas para a corte do Brasil e levando o ouro, as madeiras e as pedras preciosas para Portugal.
Rugendas, em suas caminhadas pelo Brasil, passou pelo Porto de Estrela ,onde ficou instalado o tempo preciso para desenhar à bico de pena o movimento dos navios, tropeiros, dos escravos com suas cargas, os afluentes do rio e o próprio rio que hoje mal comporta que um pequeno barco a remo, de pescadores, trafegue por suas águas.
Rugendas desenhou os burros derreados pelo peso de suas cargas, o cansaço dos tropeiros, e só não desenhou a sujeira vermelha do barro de suas roupas porque ele trabalhava com tinta preta sobre o fundo creme do papel vergéè.
Mas passavam. Desciam de Campanha, passavam pelas matas de Jatobá e Jacarandá mineiro, costeando os rios e pousavam nos postos de abastecimento .
Um destes postos, do português Antonio Ramon, ficava nas terras dos herdeiros de Fernão Dias Paes Leme,
Ora, acontece que o pai do Carlinhos é herdeiro do Paes Leme. E, por isto, Carlinhos também o é.
No local que está sendo tratorado para o Eduardo construir uma casa estava plantado o último jatobá que sobrou da exploração de madeira da mata nativa.
Em l942 nasceu Carlinhos. Anos depois, já com seus oito anos, conta ele, mais de dez homens não conseguiam abraçar a árvore.
Nesta época o empório não existia mais. Nem mesmo a sombra do empório. Só restara um pasto imenso, o rio da Glória correndo lá no fundo, e o pé de Jatobá. O Antonio Ramon, dono do empório, deu origem à família que hoje é nome de rua na cidade. A Comendador Ramon.
Neste empório, em mil oitocentos e pouco, pouco antes da libertação dos escravos, Antonio Ramon trabalhava ajudado por sua única filha Maria.
A mulher, mal chegada de Portugal não suportara os humores da terra e morreu quando a menina nasceu. Antonio contratou uma ama de leite, escrava da terra que ele alugara para montar seu empório e que pertencia aos herdeiros de Fernão Dias Paes Leme.
Conta Carlinhos que Fernão ia acumulando as pedras que encontrava, crendo que eram esmeraldas. E se esfalfou nesta lida, por mando da Coroa. Encontrar o máximo de esmeraldas, era a missão. Quando o caçador de pedras acreditou que ao prestar contas de seu tesouro no Reino receberia extensas sesmarias, partiu para a corte. Esvaziou seu embornal no Paço e pasmou, ao ser informado pelo conferente, que levava apenas turmalinas, sem qualquer valor comercial.As pedras brilhavam de deboche.
Desesperado, retornou aos rios, com seus escravos, para achar as pedras verdadeiras. Desta vez seguiu um caminho diferente e foi para Goiás. Lá, conseguiu seu intento. Recebeu algumas terras ao sul das Minas Gerais. Não a província inteira, como desejava.
Por pura teimosia, rancor, retornou aos rios de minas. Percorreu todos. Na época das chuvas era costume colocar dentro dos rios um grande pilão, parecido com os de socar café, com a boca mais larga e, dentro deles, um azougue que atraía todos os metais para dentro do artefato. Quando passavam as chuvas e os leitos dos rios retornavam ao seu normal os faiscadores retiravam seus pilões e iam batear o que estava dentro deles. Era tanto ouro naquela época que sustentou toda a Europa.
E, ainda hoje quem vai para Itajubá, por Conceição das Pedras, antiga Conceição dos Ouros vê garimpeiro que tira por dia mais de cem gramas de ouro, bateando nos rios.
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